TIRANDO AS RODINHAS...

A tensão aumentava a cada dia.
O Natal se aproximava e ela roínha a unha do dedo polegar da mão esquerda.
A ansiedade era clara, mas ela não sabia o quera ansiedade.
Seus 5 anos eram apenas o início de uma longa trajetória.
Será que ela ganharia a bicicleta que o pai prometera?
Será?
Chega a noite de natal, todos reunidos na sala, presentes sendo entregues e ela é chamada. O coração dispara, dedo na boca segurando a ponta da unha, olhos abertos e com lágrimas
prontas para caírem.
Entra o pai na sala, com a bicicleta mais linda que ela já vira.
E com rodinhas laterais de apoio. Linda, vermelha, com cestinha
e tudo.
Abraços, beijos, chorinhos, apertos no coração que vão
embora e dão lugar a um sentimento que ela descobriria
mais tarde chamado felicidade.
No dia seguinte, o pai e ela no jardim pedalando pela primeira vez.
A mão do pai presente em seu ombro, no banquinho,
orientando e permitindo que ela pedalasse e andasse,
quase sozinha. Ainda bem que tinham as rodinhas, pois ela cambaleava muito. Sempre é assim.
Meses depois, ela estava mais segura, mais determinada, mais experiente e num domingo, dia lindo, pediu para o pai retirar as rodinhas. Ela já tinha seis anos e andar com rodinhas era
"coisa de criança". Ele retirou, ficou ao lado dela, correu atrás
da bici enquanto ela pedalava, solta, sozinha, dona do controle
e da direção tomada.
E a partir daquele dia, sem ajuda do pai, ela pedalou.
Pedalou e foi. Foi e descobriu a vida no banco da bibicleta tão sonhada.
Pedala hoje por todos os cantos, firme e segura.
Enfrenta trânsito, corre, passeia, visita a todos com a bicicleta dela.
E o pai, lá do jardim ficou olhando a menina se soltar.
E até hoje aguarda, pelo menos, um obrigado.
Assim são nossos filhos, assim são pessoas em nossas vidas.
Orientamos, auxiliamos, preparamos para empreitadas maiores.
Mas não esperemos um obrigado.
Deus nos recompensa.
Filhos e pessoas tem uma trajetória a seguir.
Uma vez feita a base, conquistado o apoio necessário, pronto.
A vida é um horizonte aberto para ser conhecido passo a passo.
Quem sabe, um dia, alguém lhe diga: obrigado.
Sem rodinhas.