E ela chegou na loja "chic", como ela chamava, entrou com os cabelos
ao vento, rasteirinha fazendo barulho, maquiagem para as 11 da noite,
túnica branca sobre o fuseau preto, perua à toda prova.
Só que eram dez da manhã e ela, levada pelo vento, falando com a
voz uns 20 decibéis acima do normal.
Na loja, a vendedora capaz e treinada, profunda conhecedora dos
móveis e de decoração, foi atender a perua nova que chegava.
Ela, sem a menor cerimônia, deu a bolsa Luis Vutão para que a
vendedora segurasse, apontou para uma peça e perguntou:
"quanto sai aquele aparadouro?"
Ao ouvir isto, "aparadouro", a vendedora já sentiu o que vinha pela frente.
Colocou a bolsa da perua no sofá ao lado e informou o preço do "aparadouro".
A perua, ainda andando pela loja, passinhos rápidos com a rasteirinha
fazendo barulho, perguna lá do outro lado da loja, com aquela voz
que não precisa de celular: " e este sofá aqui, com as almofadadas
na cor diferente"??
A moça, gentil e calmamente, informou o preço.
E assim foi durante uma hora e meia, com a perua andando, vendo e perguntando tudo, sempre com a voz mais estridente do que o normal.
Tomou cafezinho e fez barulho no último gole, como quem chupa a bebida.
Atendeu o celular, falou com a empregada e disse:" faz om corqueti e
um omeleti que o maridão gosta. E ocê sabe, nega: tem que agradar o
maridão. O cartão de crédito é o dele.".
Anotou tudo que foi perguntado, fez as contas de cabeça, olhou para
a moça do atendimento e disse:
"vou levar tudo isto. Mas, querida, manda entregar tudo lá e casa,
ainda hoje, até as 6 da tardi.....taqui meu cartão. Pode passá e não
precisa nem consultá...!"
A moça, incrédula, ainda deu um desconto de 5% para pagamento
no cartao, passou e foi aceito, anotou o endereço lá no Boqueirão,
acompanhou a perua até o estacionamento da loja, onde estava
parada uma Cherokee zero quilômetro.
A perua partiu, a moça sentou-se e disse: eu morro e não vejo tudo.
Uma perua destas entra, grita, faz escândalo, fala errado e compra
15 mil reais, à vista, no cartão. E o cartão passa. E mora no Boqueirão....
(sem demérito para quem mora, mas a pose era de quem morava em outro
lugar da cidade).
Tudo isto para mostrar aos amigos, que quem trabalha no comércio
vê de tudo, encara tudo, aceita tudo, não entende tudo, mas convive
com tudo.
E é assim.
Nos últimos dez anos, o dinheiro mudou de mãos.
Hoje, quem não tomou chá em colher de prata, tem a prata, o chá importado e dá as cartas. E quem, no passado, tomou o chá em colher de prata, mantém a educação, a classe, mas está meio sem dinheiro. Não todos, claro.
O comércio é uma escola onde se vê como as pessoas agem e são.
Ainda mais as mais novas que usam um dinheiro que nunca tiveram.
E não sabem como usar adequadamente. A casa da perua, segundo a
vendedora, era um verdadeiro show room de loja de tintas: cada parede
de uma cor, azulejos de vários tons, tudo misturado.
Do cliente mais refinado, não espere muito, a não ser um bom papo e uma
venda normal. Das novas, espere tudo, se prepare para tudo, ouça de tudo.
E na saída, sorrindo, a perua ainda disse para a mocinha: da próxima
vez, segure minha bolsa Luis Vutão, por favor.Tchau queridinha....".
Pode?
Pode.
E o pior: é fato verídico.....
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